Arde Portugal e arde a nossa pele


Esta é das crónicas mais difíceis dos últimos anos. Preferia, como todos vocês, que não existisse.

Mas infelizmente existe, e infelizmente é também um grito em jeito de desabafo por tudo aquilo que o nosso concelho e o país estão a viver.  

As últimas semanas foram um Inferno de chamas para Portugal, levando o Governo a acionar este fim de semana o Mecanismo Europeu de Proteção Civil.

Chegar a Abrantes e ver parte do concelho reduzido a cinzas é uma espécie de catarse do mal. Assistir ao inferno de sexta-feira à noite com as chamas a “lamberem” a encosta do quartel, em perímetro urbano, e a lavrarem como se não houvesse amanhã, é impossível de descrever.

A nossa terra, por mais que não queiramos, é-nos sempre mais cara que as outras, sabendo nós que por todo o país o inferno é o mesmo.

E começa a ser redundante falar deste drama. De um País inteiro que arde sem que ninguém consiga minimizar os impactos.

Passaram-se décadas e tudo ficou na mesma, como todos sabemos. Paulo Fernandes, especialista em incêndios e investigador da Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro, lembra aquilo que está à vista de todos, mas que dirigentes e estruturas teimam em não assumir: «temos um sistema de prevenção e combate a incêndios desajustado. 

O país precisa de uma reforma estrutural na forma como se combatem os incêndios em Portugal».


Depois, os restantes fatores fazem o resto: desordenamento florestal, as características invulgares do território e do clima, que ajudam a explicar, pelo menos em parte, o porquê de Portugal ter um número anormal de incêndios quando comparado com os restantes países da bacia do Mediterrâneo, como Espanha, França, Itália e Grécia.

Entre 2000 e 2013, mais de metade dos incêndios registados no sul da Europa aconteceram em Portugal. Em 2016, mais de 50% do território que ardeu na totalidade da União Europeia foi português.

Com o flagelo de mais um verão de cinzas, será que ainda faz sentido perguntar “por que arde Portugal”?

Provavelmente o silêncio à pergunta é a melhor resposta. Entretanto o povo vai “lambendo” as feridas do que o lume lhes levou, entretanto virá mais um inverno e tudo ficará em sossego, até ao próximo verão.

E assim se faz um país, que se anula a ele próprio, em matéria de fogos, floresta e autoridade na matéria.

Crónica de 14 de agosto, na Antena Livre, 89.7, Abrantes. OUVIR

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